Paraty. Chegamos.
Gostaríamos de agradecer todo o apoio que tivemos dos amigos, da
família. Os e-mails encorajadores, a força e a energia positiva que
podíamos sentir nos momentos mais difíceis. Agora precisamos comer,
dormir, comer, dormir, comer, dormir, ir ao hospital "vê se esse pé
inda tem jeito, sô", e pegar o caminho de volta.
Paraty, 16 de fevereiro de 2009.
Nós viemos pedalando!
"Você não sabe o quanto caminhei... (pedalei, empurrei)
Pra chegar até aqui..."
Forte abraço.
Weimar Pettengill e Adauto Belli
Planejei tudo. Datas, partidas, calendário, alimentação, pontos de
apoio, emergências. Mas não poderia sequer supor o que de fato
enfrentaríamos nessa jornada. Ainda estou surpreso com o desfecho.
Carranca – Caxambú
Nosso sábado começou assim: 15 graus às 06h00. No café da manhã, uma
chuva torrencial parecia o prenúncio de um dia bom para muitas
coisas, menos para pedalar. O que tínhamos pela frente então, nem se
fale.
A meta de chegar à Cruzília (60 km) podia facilmente ser substituída
por sobreviver até Minduri (45 km) por outra estrada. Trocamos o
café quente e o aconchego do restaurante onde um professor de
geologia da Unicamp trabalhava com um grupo de alunos, explanando
sobre a importância da região de Carrancas para sua área de
pesquisa, pelas roupas molhadas. E partimos, ainda sob forte chuva,
neblina e frio.
Não há asfalto na direção que vamos. Nenhuma outra alternativa a não
ser encarar a lama e os atoleiros. E ainda estamos psicologicamente
exaustos pelo trecho do dia anterior, quando empurramos a bike por
mais de 30 km, numa longa e extenuante atividade de quase 06 horas.
Pelo quarto dia consecutivo, muita chuva.
Meus problemas com os pés se agravaram. Praticamente perdi uma
camada grossa da planta do pé, e empurrar a bike não é uma atividade
das mais simples. O acúmulo de pedras dentro da sapatilha parece
transformar- se num martírio sem fim.
Fome, frio. O dia de hoje ficará registrado em nossas mentes.
Empurramos a tandem na maior parte do trajeto. Quer dizer, nas
subidas e no plano. Nos atoleiros, carregamos. Longos trechos.
Descobri uma forma de encaixar o guidão traseiro nas costas para
suportar melhor os estimados 50 kg que pesa conjunto. Mas o preço é
alto. E nas descidas, bem, pelo terceiro dia consecutivo nada de
freios.
O mineirinho que acompanhava nossa preparação para o começo do
pedal, apertando as manetes de freio, resumiu assim nossa situação:
- Uai, sô! Desse jeito se ocês precisá dá uma paradinha, nem pra
esperá a "istremunção" ocês dá conta.
De fato. Freios para nada.
Depois de tentar lavar a relação da bicicleta em vários rios,
desistimos e seguimos na marcha "agora já era" até encontrar um
asfalto, perto de Cruzília. Descemos a serra rezando para não
precisar parar nem diminuir a marcha, até que conseguimos chegar a
uma padaria na cidade. Ah! Santo pão com salame.
Depois de comer – 04 sanduíches cada um, com 02 litros de Coca-Cola,
seguimos para Caxambu, na esperança de encontrar uma loja de bike
que nos fornecesse freios novamente. No caminho, rezei, sô!
E fui atendido. Chegando à cidade um rapaz com uma criança olhou
intrigado para o tamanho da bike e para nossas caras de "onco tô?" e
perguntou o quê estávamos procurando.
- Uma loja de bike, ou melhor, o telefone de um dono de loja de
bike, já que passam de 19h30.
- Serve um dono? Se servir, posso abrir a loja!
- Uáááá!!! – como dizem os mineiros.
Metal Bike. Dú. Guardem esse nome e coloquem na agenda se vierem
pedalar em Caxambú. Tenho freios! Uáááá!
Depois da manutenção, descobrimos que a Estrada Real e as trilhas da
região estão intransitáveis. Há mais de 30 dias chove forte na
região, e nos últimos 05 dias um verdadeiro dilúvio se instalou. Noé
já é esperado naquelas bandas. A opção agora era asfalto.
Fiz e refiz as contas antes de consultar meu carona "sempre pronto".
Apenas 240 km até Paraty. E uma vontade insana de concluir meus
planos de chegar na data que planejei.
Você conhece o termo "não dá", ou o "não tem jeito"? Eu não conheço
mais.
Caxambú – Paraty
Esse é o tamanho da última empreitada. Da última meta. Só 240
km, "descendo" pra praia. Dá, tenho certeza.
- Vai na frente que eu vou atrás – disse-me o Adauto, que completou:
- Quero tomar café em MG, almoçar em SP e jantar no RJ, de bike.
Segundo os mineirinhos de plantão, um tirin de frobé.
- Ocês vai subi dois morro, três no máximo.
Voamos baixo. O asfalto molhado, chuva insistente, bom pra segurar a
temperatura dos discos de freio. A primeira perna, até o almoço, de
120 km foi cumprida com louvor. Descemos a Serra rumo à Via Dutra a
mais de 100 km/h. Nem os carros nos ultrapassavam. Continuo
acreditando. Não naquele mineirinho dos 03 morros. Subimos quase
1400 mt no trecho.
A Dutra, apesar do Adauto não acreditar em mim e demonstrar pânico
com o barulho dos caminhões, foi tranqüila, com média de 25 km/h.
Vai dar, tenho certeza.
Ao deixar a segurança do acostamento da BR 116 em Guaratinguetá – SP
e rumar por uma estrada péssima e sem acostamentos para Cunha, o
policial rodoviário tentou de todas as maneiras nos dissuadir de
continuar, já que o trecho até Paraty está interditado e não passa
nem a pé, segundo a autoridade.
Como? Pedalei 1700 km para não terminar a Estrada Real? Não dá? Não
tem jeito?
Seguimos, e eu totalmente exausto por um falso plano que nem de
coroinha era possível ver o asfalto passar. Uma eternidade. Ao
chegarmos à Cunha, já quase 21h00, troquei o desejo de parar por uma
vontade incontrolável de seguir adiante. Jantamos e, sob protesto de
todos no restaurante, abraçamos a última perna de 50 km restantes.
Levando nas costas 2.400 mts de ascensão e 17h00 de atividade
ininterruptas, até iniciar o que chamamos de degrau do cão.
Mal posso esperar para contar em detalhes como foi nossa noite.
De fato, a estrada está interrompida. Mas o policial errou quando
disse que caíram 32 barreiras, no trecho de 15 km que separa o alto
da Serra da Bocaina do Oceano Atlântico. Contei 117 desmoronamentos.
Crateras colossais, lamaçal, pedras de todos os tamanhos, quedas,
empurra bike, carrega bike, down hill suicida na escuridão da
mata, "serial killer", sombras e alucinações que acompanharam meu
parceiro nessa louca aventura. Descemos para a praia subindo 3400
mt, em 247 km, tem base, sô?
Finalizamos 25 horas non stop às 06h00 da manhã, em frente à
pousada - que só abriria às 07h00.
Na página do Desbrava é possível saber mais detalhes dessa aventura
www.desbrava.com
Um pouco da trajetória do Adauto no
Projeto DV na Trilha
Matéria do Correio Brasiliense em 29Jan09
Três pequenas mochilas pesando pouco mais de 28 quilos. Esta é toda a
bagagem que acompanhará os ciclistas Weimar Pettengil, 37 anos, e
Adauto Xavier da Trindade Belli, 37 anos, no trajeto de quase 1,7
mil km (20% apenas de asfalto) a serem percorridos pela dupla até
Paraty, no Rio de Janeiro.
Sob um céu encoberto de nuvens e uma brisa fria, a dupla
deixou a capital federal na manhã desta quinta-feira (29/01) em
direção a uma viagem nunca antes vivida por eles, mas já sonhada por
Weimar.
A bordo de uma bicicleta Tandem de cor azul- que leva duas
pessoas – eles partiram. Sentado a frente da bike, Weimar ficará
responsável pelo percurso que irá durar 18 dias. A função de Adauto
será registrar todos os momentos desta aventura. O carona em
decorrência de uma retinose pigmentar, quase não enxerga.
Antes mesmo da cidade acordar, amigos e familiares já se
concentravam na Catedral de Brasília, ponto de partida dos
ciclistas. Muitos foram até lá para desejar boa sorte e fotografar a
dupla. A professora de educação física e mãe de Weimar, Nilma Garcia
Pittengill, 59 anos, era só sorriso. "Trabalho há 20 anos com
esporte adaptado. Esta viagem é uma realização tanto para meu
filho como para mim também". Preocupação de mãe? "Não. Meu filho
pedala há muito tempo, tem semanas que ele passa no meio do mato.
Ele tem técnica e experiência para isso, sei que tudo vai dar
certo", disse confiante.
Cerca de dez ciclistas do clube Coroas do Cerrado também foram
prestigiar a dupla. "Weimar sempre foi aventureiro. Ele é conhecido
na cidade por promover eventos como: 100km Cerrado e JP Montanha.
Esse é o perfil dele", disse um dos integrantes do grupo, Oswaldo
Silva, 50 anos. Os ciclistas chegaram unformizados e a bordo de suas
bicicletas. Eles acompanharam a dupla até o techo do Jardim
Botânico, no Lago Sul. De lá a dupla seguiu viagem.
O primeiro caminho a ser cumpido será de Brasília até Unaí, serão
180 km sob as duas rodas. "Não temos hotel reservados em cidade
nenhuma. A idéia é chegar e procurar um local que melhor atender as
nossas necessidades" , conta Weimar.
Durante os 18 dias, a dupla
passará por 16 cidades até chegar a Paraty. Dois dos 18 dias, serão
reservados ao descanso. O intervalo dos tragetos será reservado
também a anotações, que irá se transformar em um livro. A idéia da
dupla é terminar de escrever o livro em Paraty, mas antes
disso "Esfriar o motor e cair no mar", adianta Adauto.
Preparação
Para a dupla, de todos os itens que antecederam a viagem o mais
difícil foi preparar as mochilas. "O Adauto fez questão de incluir
dois pares de tênis.
Ele quer correr 10 km no fim de cada dia. Então, como parceiro é
parceiro
tive que obedecer. Mas, foi uma verdadeira sessão de desapego", ri
Weimar. A dupla que mal se conhece só fez dois treinos antes da
viagem. Em um deles o Correio acompanhou.
O sonho
Weimar Pettengill, nasceu em Mato Grosso do Sul. Ele mora no Park
Way com a mulher e dois filhos. Já Adauto Xavier mora na zona rural
do Tororó, é adestrador de cães, solteiro, sem filhos.
Em comum, eles só tem a paixão por esportes de aventura. Tudo começou quando
Weimar pensou em fazer uma grande viagem de bicicleta. Mas, o
empresário pensou que seria muito egoísta fazer a viagem sozinho,
então ficou sabendo pelo grupo ciclístico Rebas - projeto
que leva deficientes visuais para passeios de bicicleta - de um certo
Adauto, que já pedalava havia um ano e adorava experiências
radicais. Weimar fez o convite a Adauto, que não hesitou em aceitar.
Apoio e Promessas
O secretrário de Esportes, Aguinaldo de Jesus, foi até o local levar
um recado do governador do Distrito Federa, José Roberto Arruda, aos
atletas.
"O governador pediu para dizer que as ciclovias que serão colocadas
nos principais trechos da cidade já estão em licitação. Ele ainda
reforçou que apoia o grupo e incentiva as reivindicações prometidas
por ele", relatou.
Segundo o secretário algumas cidades já tem ciclovias como São
Sebastião, Samambaia e Lago Norte. "Está muito aquém do que a cidade
precisa. As pessoas só vão deixar os carros em casa quando se
sentirem seguras", reconheceu.
Conheça o trajeto
29/01 Brasília-Unaí 180 km
30/01 Unaí-Brasilândia 142 Km
31/01 Brasilândia-Pirapora 167 km
01/02 Pirapora-Corinto 140 km
02/02 Corinto-Diamantina 110 km
03/02 DESCANSO
04/02 Diamantina-Serro 64 km
05/02 Serro-Conceição 63 km
06/02 Conceição - Itabira 70 km
07/02 Itabira-Ouro Preto 100 km
08/02 Ouro Preto-Santana dos Montes 73km
09/02 DESCANSO
10/02 Santana dos Montes-Prados 69 km
11/02 Prados-Capela do Saco 75 km
12/02 Capela do Saco-Airuoca 110 km
13/02 Airuoca-Itamonte 59km
14/02 Itamonte-Cachoeira 95km
15/02 Cachoeira Paulista-Paraty 130km
Total percorrido: 1.627 km